terça-feira, 24 de dezembro de 2013

Retorno ao Inferno dantesco

 Há um ano, eu trabalhava na Livraria Cultura. Certo dia, uma senhora veio até o Setor de Reservas buscar o seu exemplar italiano da Divina Comédia, de Dante Alighieri, e me encantou ao falar sobre como o meu nome era também o da musa inspiradora de Dante, sua amada Beatriz. A fala da senhora me encantou e aventurei-me pelo universo dantesco, caminhando com Dante em sua jornada pelo Inferno, Purgatório e, enfim, o Paraíso.
 E eis que, 365 dias depois, deparei-me novamente com a descida do poeta ao mundo inferior nas páginas da nova obra de Dan Brown. Mais uma vez, o leitor acompanha o simbologista Robert Langdon por um mundo de obras de arte famosas que compõem mistérios envolventes. Dessa vez, a ameaça enfrentada por Langdon parte de uma ameaça biológica, um vírus escondido capaz de reduzir a população em prol da sobrevivência da raça humana.
 A primeira página prende a respiração de quem segura o livro: Langdon acorda em um hospital na Itália, com um ferimento na cabeça e nenhuma lembrança do que aconteceu nos dias anteriores. Começa então a sua aventura, que acaba por ser guiada pelas páginas do Inferno de Dante. O personagem principal (e, diga-se de passagem, o leitor que o acompanha) sente como se fosse ele o acompanhado por Virgílio pelos nove círculos do Inferno. Dan Brown desvenda a Itália por meio de nomes como Botticelli e Vasari, além da trilha sonora de Franz Lizst.
A já conhecida habilidade do autor de fazer com que o leitor conheça a fundo obras de arte mundialmente famosas e as ruas da Itália não é suficiente e dessa vez Brown nos faz refletir sobre o perigo da superpopulação. Suas palavras colocam em dúvida os atos do "vilão" da história, e nos pegamos refletindo sobre o terrorismo justificado da ameaça criada. Como sempre, a pesquisa a fundo feita pelo autor com a ajuda de sua mulher dá uma veracidade à obra que é pouco encontrada no mundo da literatura.
 Se o nome de Dante é lembrado ao falar de "literatura obrigatória", assim deve ser o de Dan Brown. Além de entretenimento, Inferno pode ser uma grande fonte de aprendizado sobre a história da arte, a simbologia e a filosofia. Vale a pena acompanhar Robert Langdon em sua descida à lagoa que não reflete as estrelas.

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Um jeito de ser bom de novo

A cultura afegã torna-se objeto de interesse de qualquer um que se aventure pelas páginas do romance de Khaled Hosseini. O caçador de pipas conta a história de Amir, um garoto afegão que vai construir a sua personalidade em torno de Hassan. O sistema de castas do Afeganistão torna o relacionamento de Amir e Hassan algo que não é bem visto por aqueles que se orgulham de sua posição social, fazendo com que o desenrolar da obra se dê após o abuso sexual sofrido por Hassan sem uma intervenção de seu melhor amigo.
A escrita de Hosseini faz o leitor mergulhar nos pensamentos de Amir, enjoar-se com ele nas viagens de carro, desejar incondicionalmente o amor de seu baba e refletir sobre seus erros e pecados. O leitor torna-se Amir; não existe forma de encarar a obra sem refletir sobre as suas próprias atitudes e moralidade. Se tivéssemos um amigo como Hassan, assistiríamos ao seu sofrimento em silêncio? Seríamos capazes de enfiar algumas notas de dinheiro embaixo de seu travesseiro para que o menino e seu pai fossem demitidos? Ou, como manda a virtude, teríamos a coragem de enfrentar a sociedade afegã como prova de amizade?
O pano de fundo da obra é a queda da monarquia do Afeganistão, mudando todo o cenário afegão. Amir diz diversas vezes ao longo das primeiras páginas que aquele era o fim do mundo como ele e o amigo o conheciam. O declínio do país é também o declínio do pai de Amir e do próprio garoto, um perdendo a vida que conhecia e o outro perdendo a paz interior ao aceitar o fato de que teria que conviver por toda a sua vida com o que aconteceu no campeonato de pipas.
O episódio de Hassan não é a única passagem do livro que faz com que o leitor perca o fôlego. A trajetória dos dois amigos atravessa continentes e as próprias barreiras da vida quando o passado bate à porta de Amir, agora morando nos Estados Unidos. Uma descoberta surpreendente faz do leitor um admirador imediato de Hosseini e a sua trama. Religião, amizade, moralidade, redenção e o caminho para ser bom de novo fazem de O caçador de pipas essencial para a sua prateleira. 

quinta-feira, 17 de outubro de 2013

O Livro Que Roubava Sentimentos



 Quando Markus Zusak conta uma história, você deve parar para ouvir. Principalmente quando suas palavras são transmitidas pelos lábios frios de ninguém menos do que a própria Morte. Ela, que teve tanto trabalho durante a Segunda Guerra Mundial, deixa de lado os seus afazeres por alguns instantes a fim de narrar a trajetória da Menina Que Roubava Livros, a magricela Liesel Meminger.
 Tudo começa com a morte do irmão de Liesel. Esse é o primeiro encontro da Morte com a garota, que rouba o seu primeiro livro naquela noite. O Manuel do Coveiro é o objeto ao qual a menina se agarra firmemente na tentativa de trazer o seu irmão de volta, bem como manter a memória da sua mãe, que é vista pela última vez antes de deixar Liesel na casa dos Hubbermann.
  A obra de Zusak tem a Alemanha nazista como cenário. Rosa e Hans Hubbermann são habitantes da Rua Himmel, uma das últimas a serem afetadas pela guerra por estar localizada em um bairro pobre. A escrita de Zusak faz com que o leitor se apaixone tanto pelos residentes quanto pela rua em si. É impossível não torcer pelo amor infantil de Liesel e Rudy Steiner, simpatizar com a mulher do prefeito é até sentir uma ligeira afeição por Frau Holtzapfel.
 Porém, ao lado de Liesel, talvez o personagem que mais fascina o leitor seja Max Vandenburg, o judeu acolhido no porão dos Hubbermann. Após a sua chegada, é possível sentir-se como A Menina Que Roubava Livros, que estava sempre disposta a virar mais uma página por mais cansada que se sentisse. O amor da alemã e o judeu no porão fazem do livro uma leitura melancólica e que, ainda assim, é imprescindível para a estante de todos os sacudidores de palavras.
 Markus Zusak brinca com os sentimentos dos leitores ao longo das mais de 400 páginas da obra, trazendo a reflexão sobre todos os valores que regem as sociedades de todos os tempos. Os eventos vividos por Liesel Meminger e narrados pela Morte devem ser lidos por todas as gerações de amantes de livros e guardados como se fossem de uma única edição, selecionados especialmente para o indivíduo e pintados à dedo no porão da Rua Himmel. 


A Menina Que Roubava Livros em uma palavra: melancolia.


quarta-feira, 31 de julho de 2013

Para falar de literatura...

É preciso coragem para falar de literatura. Viver mil vidas em uma e compartilhar sentimentos intensos com personagens conhecidos por meio de palavras requer ousadia. Se você está disposto a colocar o medo de lado e encarar o desafio de viajar a sentenças intrigantes, curiosas, românticas, cômicas e surpreendentes, você está pronto para falar de literatura.
Eu sei que eu estou.